A escolha da canção A Desalambrar de Daniel Viglietti é particularmente significativa no contexto da ditadura civil-militar uruguaia (1973-1985), inserida no cenário de repressão política que assolava diversos países da América Latina. Lançada em 1973, a música tornou-se um símbolo da resistência popular contra a opressão do regime militar e da luta pela reforma agrária, um tema central nas reivindicações dos movimentos de esquerda, fortemente reprimidos pelo governo. Viglietti, assim como outros músicos de protesto latino-americanos, utilizou sua arte para denunciar as injustiças sociais e expressar as frustrações das classes trabalhadoras. Em suas letras, nota-se o apelo à conscientização política, ao convocar a população a “desalambrar” – ato de remover cercas, uma metáfora clara para a derrubada das barreiras sociais e econômicas impostas pela oligarquia latifundiária e apoiadas pelo Estado repressivo.
Além de sua relevância no Uruguai, a obra de Viglietti ressoou em toda a América Latina, inserindo-se no movimento mais amplo da nueva canción, que conectava diversos artistas politicamente engajados, como o argentino Atahualpa Yupanqui e o chileno Víctor Jara. Em um contexto de crescente censura e violência estatal, a música de protesto de Viglietti tornou-se um veículo essencial para manter viva a resistência e a memória coletiva. Sua prisão em 1972, antes do golpe militar, e seu posterior exílio, demonstram como o regime buscava silenciar vozes dissidentes. No entanto, mesmo no exílio, Viglietti continuou sua luta por meio da música, alcançando reconhecimento internacional e contribuindo para dar visibilidade à repressão vivida no Uruguai.
A importância de Daniel Viglietti no panorama latino-americano vai além de sua música: ele representou uma resistência cultural e política em tempos nos quais a repressão buscava silenciar qualquer oposição. Inserida no contexto maior da Operação Condor, a ditadura uruguaia intensificou a necessidade de expressões artísticas que capturassem o espírito de luta por justiça social e direitos humanos. Ao lado de outros artistas uruguaios, como Alfredo Zitarrosa e Los Olimareños, Viglietti não apenas influenciou a música de protesto em seu país, mas também contribuiu para a integração cultural das esquerdas latino-americanas, estabelecendo um diálogo artístico que transcendia as fronteiras nacionais e ecoava a luta comum contra as ditaduras militares no continente.
Música disponível em:
Música engajada na América Latina: https://memoriasdaditadura.org.br/musica-engajada-na-america-latina/.
MEMÓRIAS DA DITADURA. Daniel Viglietti. Disponível em: https://memoriasdaditadura.org.br/cultura/daniel-viglietti/.
GAÚCHA ZH. Daniel Viglietti, ícone da música de protesto latino-americana, morre aos 78 anos. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/comportamento/gente/noticia/2017/11/daniel-viglietti-icone-da-musica-de-protesto-latino-americana-morre-aos-78-anos-cj9gzyftc0djr01qn4hrlc1im.html.