1 - Ernesto Laclau expõe no artigo a sua teoria do populismo em que esse conceito é definido, não pelo seu conteúdo, mas pela sua forma de articulação e expressão política. Segundo o autor, o que essencialmente constitui um discurso populista é a construção de uma fronteira interna em determinada comunidade política que separa e, acima de tudo, constitui, de um lado, os membros do grupo populista que pretendem representar o povo, e, de outro, aqueles a quem se opõem, o poder estabelecido, o status quo. A constituição do movimento populista , do "nós", é feita por meio da identificação das mesmas demandas, reivindicações frustradas, o que cria uma espécie de solidariedade e senso de união entre o grupo, o que o autor chama de "cadeias de equivalência". Laclau argumenta que esse movimento só se mantem unido em oposição a um opositor comum, por meio da hegemonia do que chama de significantes vazios e flutuantes, isto é, palavras de ordem, slogans, bandeiras que dão um senso de unidade e sentido ao grupo, que muitas vezes são desprovidos de sentido(significantes vazios), ou possuem um sentido bastante oscilante, vacilante(significantes flutuantes). Justamente em razão dessa falta de sentido, ou sentido por demais genérico, esses significantes dão conta de manter unidos membros com posicionamentos às vezes bastante divergentes.
Além disso, o populismo possuiria uma lógica de enfrentamento, desafio à ordem institucional vigente, expresso naquele segundo sentido que Laclau identifica na palavra "demand" em inglês, ou no sentido de "reivindicação" em português, ou seja, o de impor uma demanda, uma reivindicação e não solicitá-la.
A partir dessa descrição, Laclau entende que toda política é populista em alguma medida, ou seja, que todo grupo político define a sua própria identidade em oposição, construindo uma fronteira em relação a um adversário, até mesmo os membros do que o autor chama de "centro radical", variando apenas em questão do grau ou intensidade dessa forma de articulação política.
2 - Em primeiro lugar, a forma como Laclau constrói a sua teoria do populismo com base no chamado pós-modernismo ou filosofia da linguagem, o que fica evidente nos termos que ele utiliza como, por exemplo, "significante", "hegemonia", etc.
Em segundo lugar, o acerto, no meu entender, em definir o populismo não pelo seu conteúdo, mas pela sua forma de articulação política. Pois, com efeito, o populismo abrange uma série de movimentos que possuem posições e ideologias as mais diversas, de Hugo Chávez a Donald Trump, de forma que só uma definição formal, como ele propõe, dá conta de definir adequadamente esse fenômeno.
3 - Laclau propõe que as identidades políticas constituem-se sempre em oposição a um adversário , a um grupo tido como rival, ou seja, de acordo com uma lógica do "nós contra eles". Nesse sentido, com efeito, nem mesmo os grupos mais "centristas", "institucionais", "democráticos", "pós-políticos" e "moderados", fogem dessa regra, pois eles constroem a sua própria identidade por meio da oposição ao que rotulam como "populistas", "radicais", "aventureiros", "anti-sistema", etc. Se, de fato, a política se constitui essencialmente a partir de uma lógica do "nós contra eles", então a polarização alardeada na atualidade, os conflitos morais contemporâneos, não são algo estranho à política, mas a sua própria essência. Negar essa lógica do conflito na política seria recair na lógica da "pós-política", em que a política é entendida como uma mera administração de pessoas e recursos.