Resoosta

por Tuliana Fernandes Rosa (202505667) -

O capítulo discute a relação entre retórica e política democrática, tema presente desde os pensadores clássicos (Górgias, Platão, Aristóteles, Cícero, Tácito). A retórica, entendida como arte da persuasão, está profundamente ligada à vida republicana e democrática porque se sustenta na liberdade de falar, no direito igual de voz) e na competição política. O texto também destaca que democracia e retórica produzem inevitavelmente conflito, competição e luta entre classes, o que, em vez de ser um defeito, é constitutivo da política.

O eixo central é a ligação inseparável entre retórica e política democrática. A retórica não é apenas técnica de fala, mas um instrumento de poder, liberdade e igualdade na polis. O texto mostra como, desde a Grécia e Roma, a democracia se constrói pela fala pública, pelo direito de persuadir e ser persuadido, e também pelos conflitos que essa dinâmica gera.

 

O que mais chama atenção é a ideia de que retórica e democracia dependem do conflito. Não há política sem disputa de narrativas e interesses. Além disso, é instigante perceber que pensadores como Platão já alertavam para os riscos da retórica degenerar em manipulação e tirania — um debate que ecoa até hoje nas democracias modernas, em que se molda opiniões por meio da comunicação de massa.

 

O texto se conecta à disciplina porque evidencia como a retórica, ao mesmo tempo em que sustenta a liberdade e a igualdade na vida democrática, também é fonte de tensões e contradições. Ao falar que a democracia se constrói pelo direito de falar e persuadir, mas inevitavelmente gera conflitos entre grupos sociais, o autor mostra que o embate retórico é constitutivo da política e, portanto, das próprias crises democráticas.

Além disso, a crítica platônica à retórica como manipulação das paixões dialoga com dilemas atuais, em que discursos populistas, fake news e narrativas polarizadas colocam em risco a verdade, a ética pública e a legitimidade das instituições. Assim, a mesma liberdade de expressão que a fortalece pode também alimentar conflitos morais e crises de confiança.

 

Comentário Benedetto Fontana

por Gabriel Calçada Barros da Silva (202500047) -

1 - O aspecto central do artigo de Fontana é a relação entre democracias ou repúblicas, isto é, governos populares, em que a decisão de coisas públicas depende de um grande número de pessoas, e o desenvolvimento da arte retórica. Ora, a partir do estabelecimento dessa forma de governo, surge a necessidade de convencimento desse grande contingente de pessoas, o que só pode ser feita  por meio da retórica. Essa ligação foi explorada com riqueza de detalhes, como mostra Fontana, pelos filósofos da Grécia antiga.

2 - Chamo a atenção para um ponto muito interessante constatado por Fontana, que essa oposição entre razão e retórica já estava presente na própria palavra grega logos, que pode significar tanto razão, pensamento racional quanto linguagem, discurso.

Outro ponto digno de nota é o seguinte: se, como nota Fontana, a retórica consiste, no fundo, em adaptar o seu discurso à sua audiência, então é interessante notar como Platão, apesar de seu marcante racionalismo, acabou por se render a essa arte, pois utiliza largamente esse expediente em seus diálogos. Ora, na maioria de seus diálogos ele apresenta um raciocínio , demonstração racional, para aqueles que ele acredita possuirem a predominância da alma racional, junto também com os seus famosos mitos, que se destinam, nesse sentido, a persuadir aquele público que não consegue acessar o logos. Ora, essa modulação do escrito para atingir diferentes públicos pode ser considerada como uma das formas mais inequívocas de retórica.

3 - A democracia, como foi demonstrado no artigo, está ligada umbilicalmente com a retórica, portanto, é um regime que , como afirmado pelo Professor Jean Castro, não tem o menor compromisso com a verdade, com um conhecimento mais sólido, estável, o que, em termos platônicos, poderíamos designar como episteme. Pois a retórica, como já entendia Platão, visa ao convencimento por meio do meramente aparente, do provável, da opinião, da doxa.

 

Resumo, crítica e relação

por Rafael Nogueira Alves Tavares da Silva (202500062) -

O núcleo do ensaio "Rhetoric and the roots of democratic politics", de Benedetto Fontana, é a tensão entre dois modos de compreender a retórica: 1) como elemento constitutivo da vida republicana e democrática, inseparável da liberdade e da igualdade, pois falar em público é exercer a liberdade de falar em igualdade de condições (cidadania); 2) como instrumento de manipulação, capaz de seduzir, enganar e fabricar ficções com aparência de verdade.

Essa ambiguidade atravessa toda a tradição política ocidental, de Górgias e Aristóteles, que ligam a retórica à participação cívica, a Platão, que a vê como perigosa, até Maquiavel, Hobbes e os Federalistas, que lidam com o conflito faccional e com os riscos da palavra pública. A retórica é inseparável do conflito e, portanto, da própria democracia.

O que mais impressiona é a maneira como o autor mostra a ambivalência platônica: em Górgias, a retórica é denunciada como lisonja; já em Fedro, ela é parcialmente reabilitada como “verdadeira retórica”, subordinada à filosofia, que usa a persuasão para educar. Isso revela que o problema não é apenas se a retórica engana ou instrui, mas quem a controla e com quais fins.

Chamou atenção também a solução dos Federalistas: aceitar a retórica faccional como inevitável, mas “domesticá-la” institucionalmente pela multiplicação de facções e pelo sistema de freios e contrapesos. Isso levanta uma questão: seria preferível ampliar o espaço do debate público, correndo o risco dos demagogos conduzirem todos ao caos, ou restringi-lo, correndo o risco de um discurso oficial monopolizado? Em outras palavras: o pior perigo é a tirania da palavra única ou a cacofonia sem freios?

O programa da disciplina mostra que a crise da democracia é pensada a partir da tensão entre opinião e verdade e dos conflitos morais inconciliáveis que emergem no espaço público. O autor oferece contribuição efetiva para isso:

Se a democracia é inseparável da retórica, ela é inseparável do conflito discursivo. Retórica é essência do regime, não acidente.

Quando o Estado responde à retórica popular com retórica oficial armada de força (como em Hobbes ou em regimes contemporâneos que censuram), temos algo como o Leviatã se impondo: a substituição do logos plural pelo logos monopolizado.

A disciplina discute também as guerras culturais. O Fontana ajuda a entender que tais disputas são condição permanente da democracia, pois nela a linguagem é sempre campo de batalha. A crise não é exceção nem desvio. É regra de uma ordem fundada na palavra e no dissenso.

Por fim: retórica e crise são duas faces da mesma moeda. Onde há democracia, há disputa, facções, persuasão e manipulação. Onde não há isso, temos silenciamento, tirania, e, numa visão arendtiana, violência -- ou seja, a morte da política.

Retórica e democracia - uma questão

por Tiago Mazeti (202500052) -

Se ser cidadão é algo que se faz pela palavra, mais especificamente pelo uso público da palavra em situação de reconhecimento daquilo que é dito pelos iguais e em situação de disputa e deliberação sobre a coisa pública, então a generalização do direito de falar publicamente é característica distintiva, e talvez sine qua non, da democracia. Ser cidadão significa ter o direito à palavra e ter sua palavra reconhecida. Mas teria o cidadão que se preocupar com a qualificação daquilo que fala? Como afirma Fontana, baseando-se em Tucídides, os líderes da fração democrática são eles próprios homens de substância e educação, habilidosos em administração (pública e privada) e nas formas e métodos de se dirigir à assembleia (p. 33-34). Estaria o cidadão de hoje preparado para falar? Teria ele de se preparar para o uso da palavra pública? Se sim, quem tem o dever de preparar os cidadãos para o uso da palavra pública?

Chama a atenção no texto o fato de que o conhecimento necessário para o exercício da retórica representa um poder de afirmar a vontade de alguém sobre outros e mostrar, de forma persuasiva, quais caminhos são desejáveis segundo um determinado ponto de vista para a solução dos problemas públicos de um grupo ou de toda coletividade. Mas, ao mesmo tempo que a filosofia política afirmava que a mudez é percebida como o símbolo de impotência e dependência, falar por falar, ou falar qualquer coisa que expresse uma via que representa os interesses de um grupo podem significar o declínio do vernáculo. O autor traz à tona um fato importante: a forma como se usa uma linguagem específica mostra algo sobre as equações de poder entre os grupos e qual é o grau de influência que os “muitos” exercem nas arenas de poder.

Mas não podemos nos esquecer de forma alguma, em qualquer análise que se faça sobre a democracia, que a retórica lhe é uma característica intrínseca que sempre está relacionada a ideias como concorrência e conflito. Creio ser essa a relação do texto com a disciplina: o momento atual de nossa história é marcado por uma intensificação da disputa política e o recurso da palavra se faz presente e está fortemente anabolizado pelo uso das redes sociais. Nesse processo, o uso da palavra “narrativa” tem sido recorrente, mas com o intuito, por parte de alguns, de descredibilizar a palavra do adversário, cada vez mais posto na condição de “inimigo”, que, supostamente, não teria direito de expor o que quer. Mas estaria realmente algum grupo fazendo uso da palavra para expor ideias ilegítimas, ou ele somente tem ganhado terreno numa área em que outros grupos já foram mais influentes? Há duas questões a serem discutidas que podem ser postas numa mesma questão: como se preza pela qualidade retórica e democrática sem sustar o direito que um determinado grupo tem de expor o que pensa?

Rhetoric and the Roots of Democratic Politics, de Benedetto Fontana.

por Lucélia de Ataide (202505661) -

1.O texto de Benedetto Fontana busca apresentar a retórica como um elemento essencial e positivo na vida democrática, ao mesmo tempo em que questiona as concepções platônicas sobre retórica e argumentação política. Segundo o autor, o antagonismo de Platão ao discurso retórico se baseia em crenças infundadas e frágeis sobre a relação entre retórica, deliberação e política.

2. Três aspectos que se destacam no texto:

1. A discussão  da inversão do preconceito contra a retórica: Segundo Fontana, ocorre um  preconceito clássico contra a retórica, especialmente aquele originado na tradição platônica e defende que essa visão é baseada em uma compreensão limitada da política, que ignora o caráter plural, conflituoso e culturalmente diverso das sociedades democráticas.

 2. A crítica à neutralidade deliberativa: Fontana mostra que os discursos políticos são inevitavelmente situados, com carga emocional e moral (bases sociopsicológicas). Isso reforça a ideia de que não existe política democrática “neutra”, mas sim debates entre diferentes visões de mundo.

3. A valorização da escuta: A retórica democrática exige que o orador compreenda a audiência, ou seja, que se comunique com empatia e respeito. Segundo Fontana, o orador que se dirige a um público de massa deve usar não apenas logos, mas também ethos e pathos para mover seu público à ação.Isso é especialmente relevante em tempos de polarização.

3. O texto de Fontana contribui diretamente para entender as crises democráticas contemporâneas, especialmente quando relacionado com as ideias de Levitsky e Ziblatt. Eis os pontos de conexão:

a) Levitsky & Ziblatt mostram que democracias morrem não apenas por golpes militares, mas por dentro — por meio de líderes eleitos que corroem normas democráticas com discursos que produzem a divisão social, antipluralistas ou deslegitimadores da oposição. Fontana, ao propor uma retórica baseada na escuta, na empatia e na busca de consenso, oferece um contraponto à retórica tóxica usada por líderes autoritários para criar inimigos, desacreditar instituições e dividir a sociedade.

b) Levitsky & Ziblatt destacam duas normas informais cruciais para a saúde democrática:

- Tolerância mútua: tratar adversários como rivais legítimos;

- Contenção institucional: autocontrole no uso do poder legal.

A retórica, no sentido proposto por Fontana, sustenta essas normas: quando políticos se dirigem ao público e aos adversários com respeito argumentativo, mantêm o espírito da democracia viva — mesmo em momentos de tensão moral.